SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
Temas como abuso, misoginia, preconceito, machismo, assédio, incesto e pedofilia, recorrentes no trabalho de Ester Laccava, são o mote da mostra “Grito de Mulher”, com três espetáculos solo protagonizados pela atriz e diretora.
O projeto abre com a peça “Curtume – Dias Secos Inundados de Acácia”, nesta sexta-feira, no Teatro Cacilda Becker, com entrada gratuita, e seguirá com apresentações de “A Árvore Seca” e “Ossada”.
“Na minha área ainda sofro de misoginia, machismo”, afirma a artista, com quatro décadas de carreira. “‘Grito de Mulher’ é um grito meu. Vou existir no que escolhi. Vou berrar para a sociedade que tenho coisas importantes para falar, questões que nos afogam”.
Os espetáculos farão temporadas de um mês cada um, com ensaios abertos e debates em que serão discutidos temas relacionados à luta feminista no período em que é comemorado o Dia Internacional da Mulher, em 8 de março.
Em “Curtume – Dias Secos Inundados de Acácia”, a atriz interpreta uma mulher que compartilha momentos de sua vida enquanto ensina a neta a costurar uma sandália de couro, para que as duas possam caminhar livremente pela cidade.
Com dramaturgia de Denizart Fazio, o espetáculo é dirigido por Laccava. “‘Curtume’ traz a universalidade que carrega e inunda nossa existência poética versus uma realidade injusta”, afirma a artista. “Como criadora, atriz e diretora me vejo capaz, envolvida, raptada para realizar essa montagem e contar a história dessa mulher que trabalhou no curtume para criar seus filhos.”
Três movimentos dramatúrgicos apresentam a trajetória da personagem. No primeiro, uma criança desenha num latão, numa espécie de rito sobre a tragédia que virá; no segundo, uma mulher com seis filhos vive a angústia de não conseguir uma vida digna; no terceiro, já velha, ela narra histórias para a neta e recebe a visita de um investigador que busca informações sobre a morte do proprietário do curtume da cidade.
Todos os personagens -os filhos, o primeiro patrão, o dono do curtume e o investigador- são apresentados por meio da narrativa da atriz.
“As três cenas de vida da personagem são estruturadas de modo a conferir um efeito trágico na constituição de uma vingança arquetípica, rompendo com uma estrutura patriarcal de opressão. É a estrutura trágica, porém, a partir de gente comum, pessoas simples, que encarnam movimentos existenciais que se propõe a dignificar a vida humana”, diz Fazio sobre a dramaturgia. “O enlace temporal com a neta aponta para o rompimento da cadeia de acontecimentos opressores que se perpetuam há séculos.”
A segunda peça da mostra, “A Árvore Seca”, já foi apresentada em festivais nacionais e internacionais, na Alemanha e em Portugal. O texto é baseado na literatura de cordel e inclui um depoimento autobiográfico de Laccava.
Em “Ossada”, o terceiro espetáculo, a atriz interpreta mulheres em situações diferentes e patéticas, com a mistura de linguagens como elemento cênico. Uma das personagens lida com o pai em coma, outra vai ao casamento de um filho, uma terceira participa de uma entrevista para a TV, a quarta sofre abusos familiares e a última luta contra um cigarro que nunca acende.
O espetáculo costura histórias da comediante britânica Maureen Lipman, da escritora polonesa Wislawa Szymborska e da artista multimídia americana Laurie Anderson.
“Eu entendo que minha entrega de mais de 40 anos servindo no palco é para comunicar. Você, sentado aí, já pensou desse outro jeito? Você, aí sentado, quer ir um pouco mais longe, mais fundo?”, pergunta Laccava. “Quer repensar esse tema?”
CURTUME – DIAS SECOS INUNDADOS DE ACÁCIA
– Quando De 14 de fevereiro a 9 de março. Sexta a sábado, às 21h, e domingos, às 19h
– Onde Teatro Cacilda Becker – r. Tito, 295, São Paulo
– Preço Grátis
– Autoria Denizart Fazio
– Elenco Ester Laccava
– Direção Ester Laccava