ANA POMPEU
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), começou a apresentar seu voto sobre as regras do Marco Civil da Internet nesta quarta-feira (4) e disse que inovações tecnológicas sempre suscitam temores.
Mendonça afirmou que a verdadeira tolerância defende pessoas, ainda que expressem ideias “idiotas ou inaceitáveis”, e que essas ideias devem ser atacadas, não as pessoas.
“A Justiça Eleitoral brasileira é confiável e digna de orgulho. Se, apesar disso, um cidadão vier a desconfiar dela, este é um direito. No Brasil, é lícito duvidar da existência de Deus, que o homem foi à Lua e das instituições”, disse.
O plenário retomou a discussão a respeito do momento em que uma plataforma deve ser responsabilizada por conteúdos de terceiros publicados em redes sociais. Hoje, as empresas apenas devem pagar indenização caso não remova publicações depois de ordem judicial.
Apenas Mendonça se manifestou. No início da tarde, ele avisou que, dada a complexidade do tema, fará a leitura completa do voto e que, para isso, precisará de duas sessões. O ministro deve concluir o voto na sessão de quinta (5).
Ao abordar o tema das fake news, o ministro defendeu uma postura autocontida do Judiciário.
“O que se busca apontar são os efeitos deletérios que decorrem de postura ativista, ao qual, no presente caso, pode culminar em agudizar ainda mais o problema que se pretende combater”, afirmou.
O ministro, que foi indicado para o cargo pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tem adotado posicionamento que contraria a ala majoritária do tribunal em diversos temas. Votou em 2024, por exemplo, para impedir Alexandre de Moraes de julgar o ex-presidente.
O Marco Civil começou a ser julgado em novembro, e houve o pedido de vista -mais tempo para análise- de Mendonça em dezembro ado. Até então, três votos haviam sido dados, dos relatores dos dois recursos, Dias Toffoli e Luiz Fux, e do presidente Luís Roberto Barroso.
A expectativa é que o Supremo promova mudanças no Marco Civil da Internet semelhantes ao que vinha sendo discutido no Congresso Nacional no âmbito de um projeto de lei sobre regulamentação das redes sociais.
Relatado pelo deputado Orlando Silva (PC do B-SP), o chamado PL das Fake News acabou travado na Câmara, em 2023, por oposição das big techs e ameaças a parlamentares.
Ao votar, em dezembro ado, Barroso afirmou entender que o artigo 19 do Marco Civil é insuficiente para o cenário atual, que demandaria regulação, mas não deve ser derrubado por completo. Ele defendeu que, em casos de ofensas e crimes contra a honra, a necessidade de decisão judicial prévia deve continuar valendo.
Nesta tarde, Barroso abriu a sessão fazendo o que chamou de esclarecimento à sociedade diante de desinformações sobre o tema.
“O Judiciário não está legislando e muito menos regulando em caráter geral, abstrato e definitivo as plataformas digitais. Nós estamos julgando pretensões que chegaram ao tribunal por via de recursos”, disse.
Toffoli, relator de um dos processos, também comentou o tema. “Aqui não se trata de nenhum julgamento que diga respeito a censura ou que tolha liberdade de expressão”, disse.
Segundo o ministro, o artigo 19 da lei estabeleceu uma cláusula legal de imunidade de responsabilização pelo período entre a postagem e a deliberação judicial. “Na forma como está hoje, essa responsabilidade só surge se descumprir decisão. Se cumprir, não tenho que pagar nada”, afirmou o ministro.
Com base no entendimento de que o modelo atual dá imunidade às empresas, Toffoli propôs no ano ado que a responsabilização se baseie em outro dispositivo da lei, o artigo 21, que prevê a retirada do conteúdo mediante simples notificação.
Segundo a votar, também em 2024, Fux propôs que as empresas sejam obrigadas a remover conteúdos ofensivos à honra ou à imagem e à privacidade que caracterizem crimes assim que foram notificadas.
Para ele, as plataformas devem fazer monitoramento ativo e retirem o conteúdo do ar imediatamente, sem necessidade de notificação de discurso de ódio, racismo, pedofilia, incitação à violência e apologia à abolição violenta do Estado democrático de Direito e ao golpe de Estado.
Por sua vez, Barroso aborda o dever geral de cuidado, para evitar que conteúdos como pornografia infantil, automutilação, indução ao suicídio, tráfico de pessoas, terrorismo e abolição violenta do Estado democrático de Direito cheguem ao espaço público.