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Política & Poder

Entenda o julgamento do STF sobre sequestro internacional de crianças

Na prática, o debate gira em torno de casos nos quais mulheres migrantes retornam ao Brasil após sofrerem violência doméstica e enfrentam processos para repatriamento de filhos

Redação Jornal de Brasília

28/05/2025 11h12

stf

Foto: Marcello Casal JrAgência Brasil

ANA POMPEU
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

O STF (Supremo Tribunal Federal) tem na pauta desta quarta-feira (28) duas ações que tratam do sequestro internacional de crianças e o retorno de crianças retiradas ilegalmente de seu país de origem.

Na prática, o debate gira em torno de casos nos quais mulheres migrantes retornam ao Brasil após sofrerem violência doméstica e enfrentam processos para repatriamento de filhos.

As ações questionam regras da Convenção de Haia sobre o tema. O texto foi aprovado em 25 de outubro de 1980, na Holanda, e foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro por meio de um tratado do ano 2000.

O texto estabelece procedimentos para assegurar o retorno de crianças e adolescentes com menos de 16 anos levados ilicitamente para um dos países que assinam o documento ou retidos neles de forma indevida.

As situações mais comuns reguladas pelo tratado são casos em que um dos pais ou parentes próximos, desrespeitando o direito de guarda, levam a criança para outro país, afastando-a do convívio familiar.

Normalmente esses casos envolvem relações conflituosas entre familiares na disputa pela custódia da criança.

As ações foram apresentadas ao STF pelo então DEM, hoje União Brasil, e pelo PSOL, em 2009 e 2024, respectivamente. Os dois processos são relatados pelo ministro Luís Roberto Barroso.

No caso do União Brasil, o partido afirma que a ordem de retorno imediato não pode ser uma regra absoluta, e deve levar em consideração o melhor interesse da criança. A legenda argumenta que a convenção vem sendo aplicada de forma equivocada, com retorno autorizado sem investigação prévia sobre as condições da criança e as circunstâncias de sua transferência.

A inicial foca em três artigos da Constituição, que fala da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre as partes e do melhor interesse da criança. A ação do PSOL é mais pontual e pede que a violência doméstica seja considerada nos casos de subtração internacional, mesmo quando há apenas suspeita disso, sem comprovação.

Barroso chegou a marcar a primeira sessão sobre a matéria para maio de 2024, para as sustentações orais, e o início do julgamento para 7 de agosto, quando a Lei Maria da Penha completou 18 anos. No entanto, duas semanas antes, o PSOL apresentou a segunda ação, adiando, assim, a análise do tema.

De acordo com a advogada Janaína Albuquerque, coordenadora jurídica da Revibra, é justamente a questão da violência doméstica que fez esse debate ser reacendido. A entidade é uma rede europeia de profissionais que oferece e e assistência para mulheres migrantes vítimas de violência doméstica e/ou discriminação.

“A maioria dos casos hoje, pelo menos 3 em 4 casos, são de mulheres que subtraem as crianças para seus países de origem e a motivação mais frequente é violência doméstica”, diz.

Segundo ela, normalmente são mães migrantes que voltam para onde elas têm familiaridade, alguma facilidade de trabalho e amparo de uma de rede de apoio.

“Mas é difícil ter dados específicos sobre essa questão, porque cada país entende o que é violência de uma forma diferente. Nem sempre as mulheres falam no começo do processo. Às vezes isso surge só no final. Então, é muito difícil coletar dados específicos sobre essa questão, mas todas as pesquisas e estudos indicam que é a motivação mais frequente”, explica.

De acordo com a especialista, desde a Convenção de Haia, alterações legislativas avançaram no entendimento sobre violência doméstica, como no Estatuto da Criança Adolescente, no Protocolo do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) de Julgamento com Perspectiva de Gênero e na alteração do Código Civil do final de 2023, que reconhece que a guarda não pode ser compartilhada quando existir violência.

“O Supremo tem todos os elementos necessários para fazer essa readequação da interpretação da convenção, porque a lei brasileira já avançou muito no sentido de entender que a violência doméstica acaba afetando as crianças e que a violência doméstica é uma violência contra as crianças”, afirma.

Para ela, a perspectiva para a decisão dos ministros é favorável, mas a discussão sobre as provas da violência doméstica é a mais sensível.

“Provar uma violência cometida no exterior é extremamente difícil. Tanto porque não existem leis em todos os lugares como existe no Brasil, quanto porque essas mulheres sofrem muita discriminação”, diz.

“Elas não conseguem angariar provas, não conseguem fazer ocorrência, não conseguem medida protetiva e não montam um dossiê quando voltam ao Brasil”.

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